Principais faltas.. projetos intervenções favelas
Quais as principais faltas em projetos de intervenção e urbanização de favelas?Colaboração : Giovanny Gerolla
Muitas vezes, boa intenção sozinha não basta. É preciso estudar as melhores maneiras de fazer com que uma intervenção em bairros com pouca infraestrutura dê frutos, seja usada, seja vista como algo próprio da comunidade, não alheio a ela ou um alienígena em meio a um espaço já precário de opções de cultura, lazer e infraestrutura. E se, por um lado, a questão do dinheiro público bem empregado é vital, por outro, não se pode deixar de pensar nos usuários. E quais, afinal, são os principais problemas encontrados atualmente nas intervenções em favelas? Consultamos arquitetos, urbanistas, governo e a comunidade local para saber quais as principais faltas cometidas por projetos e programas nesses bairros.
Gilson Rodrigue, presidente da associação de moradores de Paraisópolis, São PauloGilson Rodrigues presidente da associação de moradores de Paraisópolis, São Paulo
O que falta é o desenvolvimento de projetos em conjunto com a comunidade, ou seja, a união entre arquitetos projetistas, engenheiros, urbanistas, governo e comunidade. Só o trabalho conjunto resultará no atendimento completo às demandas da população que reside na região beneficiada, reduzindo conflitos e mantendo a maior parte da população na região - ou em regiões próximas que também se beneficiam das melhorias. Na maioria dos casos, projetos são tirados de uma gaveta e executados sem que tenham sido compartilhados ou aceitos pela comunidade. O fato de um projeto ter funcionado bem em uma comunidade também não implica que dará certo noutra, porque cada comunidade tem suas especificidades, e o desenvolvimento de um projeto deve respeitá-las para que tenha sucesso.
Regina Chiaradia, presidente da Associação de Moradores e Amigos de Botafogo - Amab, no Rio de JaneiroRegina Chiaradiapresidente da Associação de Moradores e Amigos de Botafogo - Amab, no Rio de Janeiro
O principal erro da maioria dos projetos de intervenção/urbanização de favelas apresentados pelo poder público é não ouvir a população local, subestimando o conhecimento popular de sua própria realidade. Em segundo lugar, é um erro acreditar que as melhorias urbanísticas, sozinhas, resolverão problemas. É preciso que acompanhem melhorias socioeducacionais que, por sua vez, transformem a realidade local. O tecido social-urbano jamais será rompido e reconstruído se os seus componentes não forem plenamente inseridos numa nova realidade econômica, social e educacional.
Sérgio Magalhães, arquiteto, presidente do IAB-RJSérgio Magalhãesarquiteto, presidente do IAB-RJ
Sob o ponto de vista do desenho urbano, os projetos que vejo são completos e abrangentes - com acessos, traçados de novas ruas, infraestrutura e equipamentos sociais. O que falta, em primeiro lugar, é a garantia de que governos estarão presentes na prestação de serviços públicos de manutenção, conservação e limpeza urbana - itens escassos ou até mesmo inexistentes nas favelas. A integração plena das favelas urbanizadas pressupõe essa presença, uma vez que sua ausência acarreta em ocupação e dominação por grupos marginais, gerando problemas (como a violência do tráfico) que não são solucionáveis com projetos de urbanização. Uma segunda necessidade é que se tenha visão mais ampla de que não é suficiente implantar infraestrutura e equipamentos; é preciso também melhorar a qualidade da habitação popular, em salubridade e condições sanitárias, com assistência técnica, além de aumentar o crédito para que essas melhorias possam surgir.
Jeferson Tavares arquiteto e urbanista, atuou em programas de urbanização de favelas nas regiões Nordeste, Sul e SudesteJeferson Tavaresarquiteto e urbanista, atuou em programas de urbanização de favelas nas regiões Nordeste, Sul e Sudeste
Cerca de 1/3 da população urbana brasileira mora em favelas, segundo a UN-Habitat. E elas não estão em rincões, isoladas. Fazem parte da estrutura urbana e social de nossas cidades. Portanto, estão equivocados os projetos que delimitam perímetros imaginários e desconsideram o território e suas áreas de influência. Os projetos em uma favela devem tomá-la como inserida na cidade, e propor a interface com sua dinâmica. A geografia, as redes de infraestrutura e os usos cotidianos são elementos que integram os espaços da cidade e, portanto, devem ser explorados como qualificadores urbanos dessas áreas. Valorizar o espaço público, tornar o equipamento social uma referência local e explorar a diversidade das tipologias habitacionais são alguns dos exemplos possíveis e desejáveis. Embora os problemas sejam semelhantes em qualquer parte do país, não há uma receita pré-definida, pois as soluções devem dialogar com as particularidades de cada contexto urbano.
Elisabete França, superintendente de habitação popular da cidade de São PauloElisabete França superintendente de habitação popular da cidade de São Paulo
A urbanização de favelas é uma ciência recente. Neste momento, em todos os assentamentos sob intervenção, muito conhecimento é produzido - um know-how que será usado pelas próximas décadas. O trabalho desenvolvido em São Paulo tem chamado a atenção do mundo justamente por sua capacidade de corrigir as faltas do passado, e de inovar. Uma falta considerada grave na urbanização de uma favela certamente é a ausência de participação da comunidade sob intervenção. Não basta ouvi-los como se fossem clientes, mas envolvê-los, chamá-los a compartilhar das principais decisões. Hoje, todas as intervenções dão grande importância à formação do conselho gestor: o assentamento é dividido em setores e, em cada um, é eleito um representante para integrar o conselho. Esse representante tem a função de compartilhar as decisões mais importantes e informar a população da sua área. Urbanizar favelas exige também muita criatividade e vontade de inovar. A Sehab investe na formação de uma boa equipe de arquitetos, em parceria com escritórios renomados e criativos, preparados para desafios e para criar grandes projetos e ideias que redimensionem o conceito de moradia para essas populações. Engana-se quem pensa que a população mais pobre não sabe diferenciar a boa da má arquitetura.
Fonte: http://www.revistaau.com.br/arquitetura-urbanismo/200/fato-opiniao-quais-as-principais-faltas-em-projetos-de-191187-1.asp
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