Thursday, February 05, 2009

História de sucesso na luta pela moradia

História de sucesso na luta pela moradia
31/01/2009 Fonte: http://www.sidneyrezende.com
SRZD mostra a saga de moradores que ocuparam o antigo prédio do INSS, na rua Regente Feijó, e conseguiram a concessão do local que está em reforma.

Chego pontualmente no prédio da rua Alcindo Guanabara, Cinelândia, Centro do Rio. O prédio é antigo e mal-conservado. Através de uma pequena abertura na porta que dá acesso ao edifício uma moça pergunta se sou a jornalista. A iluminação é ruim, o imponente prédio onde um dia funcionou uma unidade do INSS, o Instituto Nacional de Seguridade Social, ainda guarda nos mármores a história de um governo passado que quando mudou-se para Brasília deixou vários prédios ociosos na cidade do Rio de Janeiro, antiga capital da República.

Quem me espera é Matilde Guilhermina Alexandre, 49 anos, e Maria Darcy de Oliveira, de 46 anos. As duas e mais o grupo de famílias da ocupação da Rejente Feijó são fundadoras da Associação Moradia Digna nas Áreas Centrais. Maria Darcy, o marido, Vicente de Paulo, de 48 anos, e os 4 filhos do casal com idades entre 6 e 22 anos estão temporariamente instalados na ocupação da Alcindo Guanabara. A família de Maria Darcy e Matilde aguardam o processo de reforma de um outro endereço: Rua Regente Feijó 25A. O prédio de dois andares agora pertence às nove famílias, que conseguiram depois de mais de seis anos de luta o direito de habitar o edifício que um dia foi uma instalação do INSS. Mesmo conseguindo a moradia, elas nem pensam em parar com o trabalho social; "Nós sabemos que existem muitos prédios públicos abandonados pelo governo. Está na constituição que todo cidadão tem direito à moradia, nenhuma propriedade pode ficar sem função social, mas as pessoas não tem informação, esse é o grande problema. Elas não sabem que podem se organizar para viver melhor." explica Maria Darcy.

A história de Matilde e Maria Darcy é comum a milhares de brasileiros. Matilde é natural de Mimoso do Sul, no Espírto Santo, veio para o Rio em meados de 1980, para trabalhar e estudar. Trabalhou em casa de família e até no Mc Donalds, mas o sonho de fazer uma faculdade teve de ser adiado. "Eu ganhava um salário mínimo e quase todo o dinheiro ia embora no aluguel", explica Matilde. Já Maria Darcy morava no Irajá quando o marido ficou desempregado e a família foi despejada. A partir daí, as duas mulheres foram lutar pelo direito à moradia.

A organização em uma ocupação é severa, além de ter que funcionar, os ocupantes ainda contam com o preconceito. "As pessoas acham que somos mendigos, que estamos em uma ocupação por não querer trabalhar, mas aqui todos trabalham, muitos na informalidade. "Quem vai comprovar renda para poder alugar ou financiar uma casa sendo trabalhador informal?", questiona Maria Darcy.



Na luta pela moradia a organização é o ponto de partida

Entre os moradores da rua Regente Feijó 25 existe um estatuto que diz que é proibido beber nas dependências do prédio, por exemplo, "antes de uma ocupação nós fazemos reuniões de conscientização política. Sempre existiu um preconceito na sociedade em relação aos pobres, por isso nestas reuniões nós esclarecemos que bebidas e drogas são terminantemente proibidas, nós somos trabalhadores. Para essa luta é preciso muita seriedade", explica Matilde.

O prédio foi ocupado em 2001, até a conquista da escritura, oficializada pelo governador Sérgio Cabral. Em 2007, os moradores do Regente Feijó lutaram contra ações de despejos, sem aviso prévio, a precariedade das instalações e sobretudo o direito a uma moradia digna. Quando conheceram as arquitetas Lais Coelho e Helena Calissa, no ano de 2003, o grupo conseguiu elaborar um projeto arquitetônico para transformar o prédio comercial em edifício residencial.

O projeto deveria ser enviado para o então recém-criado Ministério das Cidades, em Brasília, para concorrer a uma licitação de financiamento do Governo Federal. Porém, os moradores deveriam ter CNPJ e por isso, foi criada a Associação Moradia Digna nas Áreas Centrais. No projeto seriam construídos seis apartamentos de 35m² no edifício da Regente Feijó. O projeto foi aceito, mas o dinheiro para a reforma do prédio só poderia ser liberado se o governo do estado do Rio de Janeiro cedesse o local aos moradores. "Foi uma luta muito grande. Mas conseguimos, depois mais três anos fazer com que o governo do Rio nos liberasse a concessão definitiva do prédio em 2007" relembra Matilde. "Foi um dia de glória para nós", afirma Maria Darcy.



A concessão definitiva depois de 6 anos de luta

No dia 7 de dezembro de 2007, os habitantes receberam das mãos do governador Sério Cabral, a escritura definitiva do edifício. No entanto, vale ressaltar que o prédio da Regente Feijó não pertence a Matilde ou a Maria Darcy. Pela escritura nenhum dos apartamentos pode ser vendido ou alugado. O local é da sociedade e os atuais moradores vão ocupar o edifício apenas enquanto for necessário. Agora, o prédio está em reforma com a verba conseguida através do projeto enviado ao Ministério das Cidades e deve ficar pronto em junho deste ano.

A história dos moradores do edifício da Regente Feijó é uma trajetória bem sucedida dentre muitas ocupações que existem no Brasil. No próprio prédio da Alcindo Guanabara, os moradores vivem em péssimas condições de estrutura e lutam pela concessão do local.


Governo cria o bolsa-aluguel

A luta de Matilde e Maria Darcy parece ter inspirado o governo federal. Com o objetivo de combater o problema da habitação foi criado em dezembro de 2008 o programa Bolsa-Aluguel. O sistema é usado com sucesso na França, na Itália, no Uruguai e na África do Sul. Segundo a secretária nacional de Programas Urbanos do Ministério das Cidades, Teresa Jucá, existem 5 mil de imóveis vazios em centros urbanos (União, estados e municípios), que poderão ser ocupados, de graça ou mediante pagamento mínimo, por famílias de baixa renda.

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